ORAÇÃO AOS CALOUROS


Há alguns dias atrás lembrei-me, subitamente, de um caso sensacional contado por meu saudoso Tio Juarez.

Aliás, permitam-me que eu me corrija, meus queridos leitores. Não foi subitamente, nem ao acaso que me deparei com tão afável lembrança, mas quando estava com amigos e familiares em um sensacional botequim na cidade de Campos dos Goytacazes, RJ.

Conversávamos sobre os tempos de outrora quando, entre um e outro copo da mais gelada e deliciosa cerveja (é sempre muito melhor quando acompanhada de pessoas amadas), me interpelaram:

— Ô Felipe, como é mesmo aquela história do Juju? Aquela que ele contava que, no científico (assim era chamado o ensino médio de tempos idos), se vestia de padre e fazia uma reza pra sacanear os calouros...

Pausa para breves parênteses: Juju era meu amado e boêmio Tio Juarez. Morador da carioca Lapa na época em que o bairro ainda ostentava seu charme original. Sujeito de cultura e coração imensos, de um carisma impressionante, que, onde quer que estivesse, marcava sua presença por ficar rodeado de pessoas, das mais variadas idades, com ouvidos atentos a suas histórias aprazíveis. Era, de fato, um patrimônio daquela saudável e inocente boemia de anos atrás. Fecham-se os parênteses.

Prontamente me pus a declarar aquela oração, externada na forma da mais bela e etílica obra de arte.

Bastou que eu fizesse a exclamação final para que a assistência, emotiva, aplaudisse ferrenhamente. Foi aí que meu querido tio Carlos Drumond me falou:

— Meu filho, você precisa escrever isso. Esse troço tem que ficar registrado pra todo mundo saber. Eu quero isso escrito pra eu poder lembrar e falar pros amigos do butiquim lá perto do meu prédio. Sempre conto pra eles essa história mas nunca me lembro da oração. Tá todo mundo curioso pra saber como é.

Eu não poderia deixar de atender ao pedido do meu querido padrinho. Abaixo segue a oração, que deve ser lida com a fé do boêmio, de copo na mão e coração nas alturas:

"ô tangas, ô mangas, ô mijas verrumas;
ô caga fivelas, ô quinta colunas;
se tens um quebranto em bundinho teu;
eu te curo com três peidos de Hitler, três de Mussolini e três da velha Cabrocha;

Se di tudi labatude;
por que não enfias e dedo no fute*;
e vais tomar no cú, filho da puta.
Saravá!"

Até a próxima.

* De acordo com o regiolanismo de Campos dos Goytacazes, RJ, "fute" (pronuncia-se fúti) significa o mesmo que ânus.

HIPOCRISIA DIGITAL


Dizer que a internet é um território livre e sem barreiras já se tornou lugar comum e creio que ninguém (ou poucos) discorde(m) da afirmação. Até mesmo nossos políticos, os reis da hipocrisia, já reconheceram essa característica da rede mundial de computadores em recente discussão que travavam acerca da regulamentação de campanhas no mundo digital.

Entretanto, muito embora seja notório esse louvável traço de vitrina da democracia, expoente liberal do mundo contemporâneo, alguns órgãos, instituições e pessoas, parecem querer se dedicar a uma cruzada em prol das restrições ao mundo virtual.

Dias desses, o site Torrent Up Forever, meca dos amantes do cinema e inimigos dos altos preços cobrados nas bilheterias Brasil afora, saiu do ar graças a mais um golpe da ACPM (Associação Antipirataria de Cinema e Música). Aliás, esse grupo de hipócritas tem se esforçado, diuturnamente, para destruir bons nichos de cultura e entretenimento que são oferecidos gratuitamente na internet.

Todavia, para tristeza dos censores e felicidade geral dos internautas, o blog de arquivos .torrent em que podem ser encontrados diversos gêneros de filmes e séries de TV voltou à ativa em um novo endereço (confiram aqui e no link colocado na barra lateral - na seção "Valem o clique) e com novo nome: Torrent Up Turbo.

Não escondo a enorme felicidade que sinto cada vez que percebo uma nova derrota da ACPM. Alguns devem me censurar e torcer o nariz para meu comentário sob a justificativa de que a famigerada associação que mencionei apenas defende direitos autorais daqueles que os detêm sob o manto da legalidade.

É verdade, mas, felizmente, essa circunstância não pode ser justificativa para qualquer comportamento do mercado de áudio-visual. A ACPM nada mais faz do que defender interesses de uma pequena minoria de estúdios e produtoras que se utilizam de seus direitos autorais para saquear o público com preços absolutamente aviltantes.

Sou um apaixonado pela sétima arte e não quero, sob hipótese alguma, levantar bandeiras contra o merecido lucro daqueles que desenvolvem obras tão importantes para a vida cultural de toda a sociedade. Entretanto, o que se pode concluir dos preços cobrados nas bilheterias das salas de cinema é uma abissal desproporção entre esses valores e o poder aquisitivo da esmagadora maioria da população.

Mesmo diante desse fato notório e repugnante, os integrantes da ACPM ainda têm coragem de escrever em seu site, na descrição de suas atividades, que "tem como objetivo fundamental proteger os direitos autorais de seus titulares, proporcionando um mercado mais ético, e oferecer meios para realização de ações que visem combater a pirataria".

Assim que bati os olhos nessas linhas nojentas me perguntei: mercado mais ético para quem? A resposta parece óbvia.

Por essas e outras que enquanto perdurarem políticas culturais nocivas de tolerância ao lucro exacerbado eu continuarei aplaudindo iniciativas independentes que levam a cultura a todos, tal qual fazem os idealizadores do Torrent Up Turbo.

Até a próxima.